terça-feira, 2 de setembro de 2008

Páscoa

A mesma raiva de novo. Raiva por não compartir a raiva. Com o que você está chateada? Ele pergunta, e eu, eu não respondo. A minha resposta não lhe parecerá razoável, eu já sei. Nunca lhe pareceram razoáveis nem uma das minhas respostas.

Eu preciso entender que o que tem valor pra mim, tem valor só pra mim e não pro outro. Talvez existam outros que compartam meus valores, minhas importâncias. Juro que da próxima vez, se houver próxima vez, que eu me relacione sério com alguém vou antes fazer uma bateria de perguntas: você gosta de carnaval, de se fantasiar e de correr atrás dos blocos? Você gosta de armar árvore de Natal e encher de presentes pra todo mundo? Você gosta de esconder ovos de chocolate na Páscoa, e de procurá-los depois? Essas são algumas das minhas importâncias. Preciso comparti-las, porque só, essas importâncias não têm a menor graça.

Como vou esconder ovos de Páscoa de mim mesma? Como vou armar uma árvore de Natal com presentes só pra mim? Como será que se faz o bloco do eu sozinho? Tudo isso, tudo isso só tem sentido na comunhão.

Acabei de descobrir, ao ler-me, que sou muito muito católica. Que irônico isso, nunca havia pensado nessa possibilidade. Carnaval, Páscoa, Natal. Todos pertencem ao repertório do catolicismo. Menos a raiva, eu acho.

Hoje Jesus ressuscitou, dizem. Eu preciso ressuscitar um outro ser no mundo em mim. Morri no carnaval e virei cinzas, veio a Dona Quaresma, velha ranzinza e franzina, e agora é tempo de ressurreição. Já se foram os quarenta dias de vacas magras, agora é só abonança. Quero quebrar a casca do ovo. Quero encontrar o que tem dentro do mundo.

Telefonei pra casa hoje, e pude ouvir, apenas, o burburinho de todos juntos. Todos juntos. É isso que eu quero. Quero ser menos eu e mais nós, muitos nós, entrelaçados, emaranhados, nós de marinheiro. Comida farta e casa cheia. Barulho de gente no íntimo. Cordões que se abraçam no carnaval. Surpresa de criança. Quero ser aquilo que se é na hora de dar as mãos. A comunhão do corpo, do vinho e do pão.

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