Tenho tanta vontade de ir à faculdade que, nas raras em vezes em que dou o ar de minha graça papagalis nas terras de Puán, não tem aula. O motivo aqui é sempre o mesmo: não tem dinheiro pra porra nenhuma, a universidade está caindo aos pedaços, os professores não ganham ou, quando ganham, quase nada, e tantos etecéteras quantos caibam nos números de qualquer estudante da rede pública.
Na minha terra, pelo menos, e apesar dos mesmíssimos problemas, quando eu “estudava”o motivo para não haver aula variava, cada dia era uma novidade: um dia resolviam fazer uma festa de sei lá quê, alugavam um puta trio elétrico e passeavam contentes em frente aos prédios com as pessoas tendo aula dentro. Obviamente todo mundo preferia descer e enfiar o pé do que ficar enfiado dentro de sala, então a gente dizia que com aquele barulho não dava pra ter aula não e pronto, não tinha aula. Outro dia o professor resolvia que não iria, sei lá por quê, não ia mesmo e pronto. Tem as clássicas chopadas sempre no início dos semestres dedicadas a bebemorar a alegria de se entrar para uma universidade. E a primeira semana de aula dedicada a fazer arte na cara e no corpos dos calouros. Os feriados, os que são perto dos feriados, quando chovia muito porque alagava tudo, etc. Ah, e tinha greve também. Pelo mesmo motivo daqui.
Aqui é sempre a mesma coisa. Mas acontece que ontem caiu uma viga de um banheiro de uma das faculdades, e por apenas dez centímetro não acertou uma mocinha. Não entendi qual foi o drama, uma viga caiu, ora bolas. Não sei como ainda não desabou o prédio inteiro! Mas aí pronto né, já viu. Ô povo pra gostar de arrumar um motivo pra uma revolução! Fecharam a UBA, a maioria das faculdades. Não teve mais aula em nenhuma delas e parece que vão ficar assim, fazendo passeatas, até sábado. Depois eles voltam às aulas.
Nem fazer greve direito eles sabem, coitados. Na minha terra sim que a gente sabe fazer greve. Quando pára, pára-se logo três meses de uma vez. Aí depois voltamos também, mas pelo menos tiramos umas feriazinhas antes e não tem nada disso de ir fazer passeata, de quebrar as coisas, de arrumar confusão com ninguém não; é tudo na paz, tomando cervejinha ou água de coco, praiana, sol e samba. Ah, meu Rio de Janeiro!
Aqui esse povo pára um dia, pára outro, e fica assim a vida toda, nunca se sabe quando vai ter aula, quando não vai, mas a gente acaba descobrindo e pode ter certeza que é sempre o mesmo motivo. Não entendo isso, falta dinheiro não falta, vamos assaltar um banco, vamos seqüestrar um rico, vamos colocar o reitor pra mijar no mesmo banheiro que a gente mija, mas, por favor, ficar repetindo que quer aumento de presupuesto não vai resolver nada. Eu não sei quando que as pessoas inventaram que poderoso escuta: os deuses são todos surdos.
No que se refere a mim, faço greve pra parar de estudar mesmo, porque a instituição já faliu. Não dá mais pra exigir que o estado garanta o ensino público porque não existe mais público, e não existe mais estado. Acabou esse negocio de saúde publica, educação publica, segurança pública, isso ficou lá no estado de bem-estar. Quem quer viver bem agora, paga, e ou você tem dinheiro, ou não. Ninguém é mais cidadão e todos somos interessantes apenas e enquanto consumistas em potencial.
Acho então que todo mundo deveria parar de consumir universidade. Se acabasse essa palhaçada de ter que ter “ensino superior”, universidade não seria um troço tão interessante pros grandes grupos econômicos e talvez os deuses poderosos não sucumbissem à sua ganância. Nada que é extremamente lucrativo é para o bem público.