quarta-feira, 6 de maio de 2009

Handwritten, handmade: palavras feitas à mão - parte 3

Quero-te só por dois instantes: um para comer-te e outro para cuspir-te. Não digiro nada, vomito. Meu estômago esverdea-se e rejeita teus amores conservados.


Sou da guerra agora, Marte entrou em minha órbita terráquea, orbitamos no mesmo compasso, transladamo-nos ao redor da mesma estrela, e dançamos teu triste tango desafinado.


Te amo clandestino. Quero comer tuas entranhas. Quero que sangres e grites e esperneies. Junto sons numa punhetagem escalafobeticamente narcisista. Quero que me toques os acordes e me arrebentes as cordas frouxas.


Eu te consumo e entrego-me a tua ânsia devoradora. Consumo-me em cubos saborizadores de amores artificiais. Não te ganho nem te perco, aproveito-te, te rumino. E te cuspo os pedaços de plástico que nunca serão totalmente absorvidos pela terra.


Quero-te agora por três instantes: um para comer-te, um para cuspir-te e outro para pisar-te. Estraçalhar-te a flor de puta que me compras, embriagado de paixões serpentinas. O meu eu te amo é vermelho carmim coberto de cinzas. Quero compor-te uma gaveta com roupas que sobem e descem, abraçam-se e empurram-se, cobertas de plástico derretido cor de sangue. Darei-te de presente, um dia. E quero que me guardes nela.


Quero que encontres minha desafinação, e que me vibres e me explodas. Quero que escutes a música que te toca meu corpo, e que construas uma escala atonal, só para mim, em teu violão.


As flores morrem pálidas, dependuradas pelas sacadas da minha alma. Tentam agarrar-se, e nada, caem uma por uma, desesperadas, no esquecimento. Abri as janelas e expulsei tudo, agora me tranco aqui, nessa melancolia estúpida, vazia e sem sentido algum. Quero sofrer e odiar-te, até que não suporte mais e precise de amor de novo. Novo. Puro. Perdoado.


Mas os filhos morrem, e agora tudo se joga pela janela. Minha janela está fechada, tranquei a porta no porão das almas. E eu visito constantemente os porões, e sei onde se escondem os ratos, e sei do feio, do horror e da tortura, que caminham comigo, gritando nervosos no meu ouvido. E gritam, gritam, gritam, e eu não posso mais escutar melodia alguma, só ruído e gritos agoniados.


Debato-me de novo, sou um inseto agonizante. E grito e só a morte me escuta. Não me ame, não, deixe-me morrer, te peço. Tranque-me numa gaveta que não abras nunca. Sou filha de Pandora. Escarre-me na boca, amaldiçoe-me. Sou Cassandra, a maldita. Esquarteje-me e goze meus restos podres. Sou Geni, me apedreje. E esqueça-me num canto escuro que nem antes.


Mas traga-me de quando em vez um copo d’água. Caso me nasça outra erva-daninha e eu precise alimentá-la. Caso eu desista de desistir de mim e me agarre de novo às flores secas da sacada. E se eu quiser plantar outras flores, e vê-las morrer novamente, traga-me água. Só um pouco de água. Se de repente eu me distrair e me esquecer do triste de mim. Água para que eu deixe de secar e sorria, enfim.